O Mágico (The Illusionist)Você já deve ter ouvido em algum lugar que “viver de arte” não é uma tarefa fácil. Imagine uma pequena cidade onde músicos, palhaços, atores, malabaristas e outros artistas disputam cada trecho das ruas para se manter. Não existe a possibilidade de todos encontrarem o seu lugar ao sol de imediato. Nesse cenário, é apresentado o personagem que dá nome a essa história. A sua identidade não é revelada, o conhecemos apenas como O mágico.

Após passar por várias cidades européias apresentando o seu número convencional de mágica, esse humilde senhor francês resolve se instalar numa cidadezinha localizada no Reino Unido. Sua companhia nessa jornada é Alice, uma garota pobre que conheceu em uma de suas incansáveis apresentações num vilarejo distante. Num momento onde os truques de mágica (que incluem os clássicos «tirar coelho da cartola» ou «algo da manga da camisa») pareciam ter perdido o brilho devido à repetição, a garotinha foi a única espectadora a se encantar de verdade com a arte do ilusionismo a ponto de largar sua vida pacata no interior e se juntar ao mágico na sua viagem pela Europa.

Alice é uma garota reservada, mas que encontrou no convívio com a arte uma maneira de alimentar suas esperanças e ampliar a visão de mundo, antes restrita apenas ao pobre vilarejo onde vivia. A mudança para uma cidade que «respirava arte», mudou a sua aparência, mas manteve a inocência de uma menina deslumbrada com a magia. O mágico, por sua vez, continuou lutando para sobreviver, tendo que aceitar até trabalho em oficina mecânica já que sua profissão não era mais valorizada.

O clima de melancolia e pessimismo é notório na construção dos personagens secundários e seus dramas pessoais. Alguns tentam suicídio, outros afogam as mágoas na bebida, resultado de anos de batalha e decepções. Não fosse a beleza e inocência da amizade entre Alice e o mágico, o filme estaria fadado a se manter sempre numa linha trágica, o que poderia comprometer o seu resultado fantástico. O toque de beleza e inocência dado por Jérome Seydoux (As bicicletas de Beleville), dispensa os diálogos, que pouco acontecem durante os 80 minutos de projeção. O filme não recebeu sequer legendas nas poucas falas que ocorrem, deixando o espectador decifrar as expressões faciais e as mímicas dos personagens em cena e vislumbrar a incrível fotografia da fita.

Fotografia que impressiona pela simplicidade e precisão dos traços. O estilo de desenho aplicado na animação é digno de uma galeria de arte. A sensação que temos é de que existem pinturas em movimento na tela. Nos momentos mais tristes, o visual sombrio toma conta da película. Quando não é mostrada uma cena noturna na chuva, são os tons pastéis que predominam no cenário durante o dia. No figurino dos personagens, de igual forma, há um contraste entre cores mortas de algumas roupas e os tons vibrantes dos vestidos de Alice, que desfila nas ruas despreocupada, sem perceber a frustração de quase todos à sua volta, incluindo o seu amigo mágico.

Em tempos onde as animações 3D, representadas fortemente pela Pixar e Dreamworks, tomam conta das salas de cinema, “O Mágico” mostra através de uma história comovente aliada a belos traços, que a simplicidade e força do 2D nas animações ainda é capaz de emocionar e envolver o espectador. A presença dessa animação entre os candidatos ao Globo de Ouro e posteriormente no Oscar reforça a idéia de que os dois formatos (2D e 3D) vão coexistir por um bom tempo, dando a possibilidade do público conferir verdadeiras obras de arte no cinema.

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